segunda-feira, 30 de maio de 2016

O texto mais lindo que já li... A menina quebrada - Eliane Brum

Era uma festa. Comemorávamos a vinda de um bebê que ainda morava na barriga da mãe. Eu havia acabado de segurá-la para que ela passasse a pequena mão na água da fonte do jardim. Ela tentava colocar o dedo gorducho no buraco para que a água se espalhasse, como tinha visto uma criança mais velha fazer. Parecia encantada com a possibilidade de controlar a água. Tem 1 ano e oito meses, cabelos cacheados que lhe dão uma aparência de anjo barroco e uns olhos arregalados. Com olheiras, Catarina é um bebê com olheiras, embora durma bem e muito. De repente, ela enrijeceu o corpo e deu um grito: “A menina.... A menina.... Quebrou”.  
Era um grito de horror. O primeiro que eu ouvia dela. Animação, manha, dor física, tudo isso eu já tinha ouvido de sua boca bonita. Aquele era um grito diferente. Não parecia um tom que se pudesse esperar de alguém que ainda precisava se esforçar para falar frases completas. Catarina estava aterrorizada. “A menina... A menina...” Ela continuava repetindo. Olhei para os lados e demorei um pouco a enxergar o que ela tinha visto em meio à tanta gente. Uma garota, de uns 10, 12 anos, talvez, com uma perna engessada. “Quebrou...” Catarina repetia. “A menina... quebrou.” 
Ela não olhava para mim, como costuma fazer quando espera que eu esclareça alguma novidade do mundo. Era mais uma denúncia. Pelo resto da festa, ela gritou a mesma frase, no mesmo tom aterrorizado, sempre que a menina quebrada passava por perto. Nos aproximamos da garota, para que Catarina pudesse ver que ela parecia bem, e que os amigos se divertiam escrevendo e desenhando coisas no gesso, mas nada parecia diminuir o seu horror. Os adultos próximos tentaram explicar a ela que era algo passageiro. Mas ela não acreditava. Naquele sábado de janeiro Catarina descobriu que as pessoas quebravam.  
Eu a peguei, olhei bem para ela, olho no olho, e tentei usar minha suposta credibilidade de madrinha: “A menina caiu, a perna quebrou, agora a perna está colando, e depois ela vai voltar a ser como antes”. Catarina me olhou com os olhos escancarados, e eu tive a certeza de que ela não acreditava. Ficamos nos encarando, em silêncio, e ela deve ter visto um pouco de vergonha no assoalho dos meus olhos. Era a primeira vez que eu mentia pra ela. E dali em diante, ela talvez intuísse, as mentiras não cessariam. Naquela noite, depois da festa, fui dormir envergonhada.  
O que eu poderia dizer a você, Catarina? A verdade? A verdade você já sabia, você tinha acabado de descobrir. As pessoas quebram. Até as meninas quebram. E, se as meninas quebram, você também pode quebrar. E vai, Catarina. Vai quebrar. Talvez não a perna, mas outras partes de você. Membros invisíveis podem fraturar em tantos pedaços quanto uma perna ou um braço. E doer muito mais. E doem mais quando são outros que quebram você, às vezes pelas suas costas, em outras fazendo um afago, em geral contando mentiras ou inventando verdades. Gente cheia de medo, Catarina, que tem tanto pavor de quebrar, que quebram outros para manter a ilusão de que são indestrutíveis e podem controlar o curso da vida. E dão nomes mais palatáveis para a inveja e para o ódio que os queima. Mas à noite, Catarina, à noite, eles sabem. 
E, Catarina, você tem toda a razão de duvidar. Depois de quebrar, nunca mais voltamos a ser como antes. Haverá sempre uma marca que será tão você quanto o tanto de você que ainda não quebrou. Viver, Catarina, é rearranjar nossos cacos e dar sentido aos nossos pedaços, os novos e os velhos, já que não existe a possibilidade de colar o que foi quebrado e continuar como era antes. E isso é mais difícil do que aprender a andar e a falar. Isso é mais difícil do que qualquer uma das grandes aventuras contadas em livros e filmes. Isso é mais difícil do que qualquer outra coisa que você fará.  
Existe gente, Catarina, que não consegue dar sentido, ou acha que os farelos de sentido que consegue escavar das pedras são insuficientes para justificar uma vida humana, e quebra. Quebra por inteiro. Estes você precisa respeitar, porque sofrem de delicadeza. E existe gente, Catarina, que só é capaz de dar um sentido bem pequenino, um sentido de papel, que pode ser derrubado mesmo com uma brisa. E essa brisa, Catarina, não pode ser soprada pela sua boca. Ser forte, Catarina, não é quebrar os outros, mas saber-se quebrado. É ser capaz de cuidar de seus barcos de papel – e também dos barcos dos outros – não como uma criança que os imagina poderosos, de aço. Mas sabendo que são de papel e que podem afundar de repente. 

Essa conversa, Catarina, está apenas adiada. Talvez, daqui a alguns anos, você precise me perguntar como se faz para viver quebrada. Ou por que vale a pena viver, mesmo se sabendo quebrada. E eu vou lhe contar uma história. Ela aconteceu alguns dias depois daquela festa em que você descobriu que até as meninas quebram. Nós estávamos na fila do caixa do supermercado perto de casa, com uma cesta cheia de compras, e havia um homem atrás de nós. Era um homem vestido com roupas velhas e sujas, parte delas quase farrapos. E ele cheirava mal. Poderia ser alguém que dorme na rua, ou alguém que se perdeu na rua por uns tempos. Ficamos com medo de que o segurança do supermercado tentasse tirá-lo dali, ou que a caixa o tratasse com rispidez, ou que as outras pessoas na fila começassem a demonstrar seu desconforto, como sabemos que acontece e que jamais poderia acontecer. Enquanto pensávamos nisso, ele nos abordou. E pediu, com toda a educação, mas com os olhos dolorosamente baixos: “Por favor, será que eu poderia passar na frente, porque tenho pouca coisa?”.  Não, acho que eu não poderia ter dito isso a você, Catarina. Não naquela noite, não agora. Ao lhe assegurar, cheia de autoridade de adulto, que tudo estava bem com a menina quebrada, com qualquer e com todas as meninas quebradas, o que eu dei a você foi um vislumbre da minha abissal fragilidade. Esta, Catarina, é uma verdade entre as tantas mentiras que lhe contei, ao tentar fazer com que acreditasse que eu seria capaz de proteger você. Vai chegar um momento, se é que já não houve, em que você vai olhar para todos nós, seus pais, seus “dindos”, seus avós e tios, e vai perceber que nós todos vivemos em cacos. E eu espero que você possa nos amar mais por isso.  
Quando lhe demos passagem, vimos que o homem não tinha pouca coisa. Ele só tinha uma. Sabe o que era, Catarina?  
Um sabonete. Era o que havia entre as mãos de unhas compridas e sujas, junto com algumas moedas e notas amassadas, como em geral são as notas que valem pouco. Aquele homem, que parecia ter perdido quase tudo, aquele homem talvez ainda mais quebrado que a maioria, porque tinha perdido também a possibilidade de esconder suas fraturas, o que ele fez? Quando conseguiu juntar uns trocados, o que ele escolheu comprar? Um sabonete. 
Catarina, talvez um dia, daqui a alguns anos, você volte a me olhar nos olhos e a dizer: “A menina... quebrou”. Ou: “Eu... quebrei”. E talvez você me pergunte como continuar ou por que continuar, mesmo quebrada. E eu vou poder lhe dizer, Catarina, pelo menos uma verdade: “Por causa do sabonete”. 
(Eliane Brum escreve às segundas-feiras) 

Quando ama, meu coração tem vida própria.

 Nessas horas só vemos o que está bem perto, não somos pessimistas e nem consequentes, não fazemos planos lógicos nem imaginamos que não é pra sempre. O coração paga pra ver e não se deixa aconselhar, tudo que escuta não processa, prefere viver, e nem sempre se arrepende, mergulha sem pensar e ama sem limites, mesmo não sendo amado. Ri e chora de si mesmo, pede felicidade, e despreza quem o repreende, tem vida própria, quando vemos já foi, já tem um novo morador, já ama novamente, já se entrega intensamente, sente.


Nas noites, senta sozinho e chora, xinga, não ama mais, não sente mais e promete que agora será independente, mas quando amanhece tudo volta, se encanta com o sol e com aquele sorriso, sente que ali será seu porto seguro. Se joga outra vez, ama intensamente, ri, chora, sofre, mas ama, ama cada vez mais forte, ama de uma maneira diferente mas com mais intensidade sempre. Mas, sabe que suas noites serão as mesmas, porém, também sabe que certamente amanhecerá.


Diakova

Passado. Completo. Perfeito.

Eu queria ter podido contar a nossa história, dizer que "agora estamos juntos", eu queria ter tido você aqui rindo de tudo que "passamos", queria ter feito cada minuto do seu dia feliz e ter dado o motivo de todas as suas gargalhadas.



Queria ter tirado o seu juízo e nas horas vagas ter sido ociosa com você, queria ter recebido todos os seus beijos matinais, beijos, no plural, beijos.
Queria ter sido a razão de você voltar pra casa feliz, ansioso pra me contar seu dia. Queria ter rido das suas burradas enquanto você me contava deitados na nossa cama.


Queria ter ido à praia com você num ônibus lotado rindo da situação ou ter estado com você na compra do seu primeiro carro.
Eu queria ter planejado nossos finais de semana com saídas ou filmes embaixo dos lençóis.


Queria hoje não está escrevendo esse texto que me doi tanto e que representa uma parte tão perfeita que nunca existiu. Você não estava pronto. Eu não estava. Mas eu estava apaixonada, porém você, não estava.
Diakova

quarta-feira, 18 de maio de 2016

Contos de Fadas: Por que são tão importantes?


Todo texto ficcional amplia, de maneira significativa, os limites do imaginário pessoal e coletivo também. Sempre que alguém lê ou conta histórias, nós nos reportamos ao ambiente em que acontece o fato que está sendo narrado e participamos ativamente do enredo, além de o nosso inconsciente, nesse momento, estar trabalhando e processando todas as informações que aparentemente são imperceptíveis para nós.



Dentre muitos textos pertencentes ao domínio estético/artístico da literatura, temos o conto. “O conto é um relato em prosa de fatos fictícios” (KAUFMAN & RODRÍGUEZ, 2005, p. 21).

Este tipo de texto, quando lido ou ouvido, tem o poder de despertar sentimentos indescritíveis e que irão fazer toda diferença mais tarde em nossas vidas, porque consta de três momentos perfeitamente diferenciados: um estado de equilíbrio, episódios que se convertem em conflitos e a resolução destes conflitos no estágio final, e isso acontece mais precisamente com a criança.

O conto se reflete no ouvinte ou leitor como um sonho involuntário pois depois de tomar conhecimento da história ela será polarizada de acordo com o momento em que a criança se encontra, e se lido outras vezes produzirá outros efeitos. Nos contos vemos aflorar, de forma bem natural e discreta, as conclusões individuais acerca da vida real, e são essas conclusões que demonstram de houve real interesse da criança na história ou não.

A fantasia dos contos de fadas é fundamental para o desenvolvimento da personalidade da criança e para auxiliar a construção do seu conhecimento de mundo. Há significados mais profundos nos contos de fadas que se contam na infância, do que na verdade os que a vida adulta ensina.

Bettelheim, em seu livro A psicanálise dos contos de fadas (2015, p.19), diz:

“Só partindo para o mundo é que o herói dos contos de fada (a criança) pode se encontrar; e fazendo-o, encontrará também o outro com quem será capaz de viver feliz para sempre; isto é, sem nunca mais ter de experimentar a ansiedade de separação. O conto de fadas é orientado para o futuro e guia a criança – em termos que ela pode entender tanto na sua mente inconsciente quanto consciente – a ao abandonar seus desejos de dependência infantil e conseguir uma existência mais satisfatoriamente independente”.

Segundo Machado, 1994, p. 43: “No espaço sobrenatural não existe tempo real, tudo acontece de repente e justamente, com total arbítrio do acaso. Os personagens existem, mas não foram criados por leis humanas. São, antes, fenômenos naturais. Por isso são seres encantados”.


Na literatura, os contos de fadas, misturam questões universais muito importantes para a maturação das crianças, elas sentem os mais diversos sentimentos, e adquirem conhecimentos sem perceber, vão criando suas ideias e amadurecendo comportamentos nas fases adequadas,  além da formação dos valores, que se dá sem moralização e sim com a combinação de realidade e fantasia no clima do Era uma vez... Misturando ainda, criaturas sobrenaturais que chamam a atenção e permitem por si que a criança vá traçando pequenos perfis de comportamento e personalidades.



BETTELHEIM, Bruno. A Psicanálise dos contos de fadas. Rio de Janeiro: Paz e terra, 2015.
MACHADO, Irene A. Literatura e redação. São Paulo: Scipione, 1994.
KAUFMAN, Ana MarÍa & RODRÍGUEZ, María Elena. Escola, leitura e Produção de textos. Porto /alegre: Artes Médicas, 2005.
 PORTAL EDUCAÇÃO - http://www.portaleducacao.com.br/pedagogia/artigos/30151/a-importancia-da-leitura-na-educacao-infantil



Diakova

Crônicas na escola - Carlos Fialho

O período da escola é sem dúvida o melhor de nossas vidas, é uma fase longa, mas que poucos percebem que passou, é nessa fase que se sucedem os melhores acontecimentos de nossas vidas e onde fazemos todas as descobertas que irão nortear nossa personalidade de jovem e adulto. Se formos leitores fiéis então, essa fase se passa de maneira ainda mais proveitosa e inesquecível.

Crônicas na escola é sem dúvidas um livro para qualquer pessoa ler, apesar de serem crônicas voltadas para jovens em idade escolar, são bem humoradas, leves e capazes nos divertir com tanta criatividade do autor.

Carlos Fialho em Crônicas na escola, reuniu, não de forma aleatória - muito pelo contrário- vários escritos com o propósito de demonstrar aos estudantes em idade escolar, que ler pode ser uma atividade divertida mesmo quando o conteúdo dos textos traz algo de educativo, com o qual possamos aprender ou refletir sobre a vida e seus aspectos cotidianos.  Além disso, são temas presentes; orgulho, machismo, consumismo, absurdo, humor e o amor.

Algumas das crônicas...
O chato, O raqueiro, É comigo?, A loja de conveniência, As histórias de uma Natal assombrada, Eu vi o amor, Verão veraneio, Beleza interior e O morro do careca.




Uma delas, a que mais gostei, segue na íntegra...
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O chato
Você conhece o chato. Na verdade, você é íntimo dele. Ele lhe acompanhou em todos os momentos de sua vida, desde a mais tenra infância até a decrepitude que vem com a idade. Foi ele que deu aquela ideia idiota de se inscrever na quadrilha do jardim 2 mesmo sem que vocês soubessem dançar. Aí você foi, passou aquela vergonha na frente de todo o colégio, dos seus familiares, das meninas do jardim da infância (mesmo que naquela época você não ligasse pra elas) e depois ainda tentou minimizar o caso dizendo “Veja bem…” O chato sempre começa suas explicações com um “Veja bem”. E como demoram as explicações do chato.
Aliás, se você deixar o chato começar a falar, é melhor sair correndo imediatamente. Quando ele começa, não para. Nunca. Além de tratar de assuntos totalmente irrelevantes para qualquer ser humano com cérebro maior que o de um calango, eles costumam ser muito abertos ao monólogo. Se eles começam a falar da nova temporada da série mais bestalhona da TV ou do último vídeo game que acabou de sair, despeça-se do seu bom-humor por aquela noite. E mesmo que você tente dar sinais de que não é muito adepto daquele assunto ou está pouco à vontade com aquele papo, ele vai continuar exibindo todo o seu conhecimento sobre a musicografia da Madona. E nem adianta olhar no relógio a cada 5 segundos. O chato não entende indiretas.
Inconveniente ao extremo, ele chega sempre na hora errada. Sabe naqueles domingos em que você quer ficar em casa sem encontrar viv’alma? Aqueles feriados em que só pretende descansar e se preparar para o próximo encontro com os demais seres humanos? Pois é. Precisamente neste dia, ele aparece para fazer uma visita surpresa e, pior, cheio de novidades pra contar! Quando você está com sua namorada ou amigos ou mãe, e ele surge do nada, como um ninja em meio à fumaça, num restaurante, ou barzinho, ou supermercado, diz coisas constrangedoras a seu respeito, revela um apelido oculto, estraga o seu dia como só o chato sabe e é capaz de fazer.
A inconveniência do chato está ligada à ausência de desconfiômetrode que ele sofre. O chato não se liga, não se toca, não tomasemancol. Ele fala de assuntos desagradáveis sobre os quais você não quer ouvir, como a eliminação do seu time, ou lembra o quanto você está gorda. Aliás, ele não só cita esses assuntos, como insiste no tema. Discorre longamente sobre sua calvície ou de como você precisa de uma plástica no nariz urgentemente.
O chato discorda de você em todos os assuntos. Ele tem opiniões fortes sobre tudo e, claro, são todas estúpidas, absurdas, inconcebíveis. Mas não adianta tentar discutir com ele. É inútil. O chato de verdade não lhe deixa completar seus raciocínios, exibir seus argumentos. Aliás, é impossível sequer conversar com ele. O chato adora interromper.
Ele sempre tenta se passar por sério, brinca de ser importante, insiste em ser adulto, mesmo que só tenha 11 anos de idade. É aquele que lhe encontra nos lugares e, sempre que há testemunhas, lhe diz: “Cara, precisamos conversar!” Se um dia você o pressionar e tentar saber dele o que tanto ele tem pra conversar com você, não vai descobrir nada. Ou então ele vai passar a destilar uma teoria tão difusa e tangente, desprovida tanto de sentido como de pertinência que você se arrependerá de ter perguntado por 8 gerações.
Quando um chato DDD (que vem de outro Estado ou cidade) se hospeda em sua casa, tenha a certeza de que vai viver os piores dias da sua vida. Dia desses recebi um destes e posso assegurar-lhes que vivi as 36 horas, 12 minutos e 23 segundos, mais longas de toda a história da humanidade. É que o meu amigo chato tinha o poder de transformar instantes em intermináveis sucessões de constrangimentos.
Pra começar, ele usava o banheiro 4 vezes por dia para fazer na privada aquela outra necessidade fisiológica que não é o xixi. E deixava o banheiro completamente empestado a cada nova utilização de uma forma que o Potengi ia parecer perfume francês. Outra peculiaridade dele era sua idolatria por Hilda Hist. Até aí, tudo bem, o problema era fazer questão de dividir sua devoção com o mundo, declamando de cor textos inteiros, por mais longos que fossem. Mas o pior era que essa não era uma exclusividade de Hilda Hist não. Esquetes da TV Pirata, aulas do programa Vestibulando sobre índices pluviométricos, músicas do Rolling Stones. Tudo, ele sabia de memória e citava sempre que podia. E não adiantava dizer um trecho só não. Tinha que ser tudo!
E mesmo com tanto conhecimento profundo a respeito de tudo isso, o chato é incapaz de executar as tarefas mais simples como ligar o computador da sua casa ou abrir a mala do carro. E é para ajudá-lo com tais ações que ele decide lhe acordar às 6 da manhã de um domingo, sem fazer a menor ideia de que está incomodando.
O chato não come verdura, mas só lhe avisa depois que você, cheio de boa vontade e ótimas intenções, serviu o seu prato. Ele olha contrariado para aqueles pedaços de tomate, cebola e pimentão, com um suplicante olhar de vítima e diz condescendente: “Não tem nada não. Pode deixar que eu tiro as verduras”, fazendo você se sentir culpado como se fosse mais terrível que Hitler, Paulo Queixada e Micarla juntos! Então ele retira as verduras e mastiga ruidosamente de boca aberta. Durante a refeição ele faz questão de conversar sobre os seus problemas de furúnculos, a cirurgia de redução de estômago de sua namorada e um conto do Rubem Fonseca chamado “compromancia”.
Ao contrário do que muitas pessoas pensam, o chato não é um cara antipático. Ele é animado e alegre. Até demais. Ri alto e de qualquer besteira. E ri das próprias piadas também, muito, mesmo que elas não tenham a menor graça e nem façam nenhum sentido. E é exatamente assim que elas sempre são. A simpatia do chato é irritante. Faz você querer esganá-lo ou beber veneno, o que estiver mais ao alcance para o momento.
No entanto, você não pode matar o chato. Na verdade, você não consegue sequer ser grosseiro com ele. É que você é refém dele. O chato é, apesar de tudo, o cara mais prestativo do mundo e você deve, no mínimo, um grande favor a ele. Foi o chato que passou 2 dias na fila, tomando chuva, sereno e sol na moleira para comprar os 2 últimos ingressos do show da sua banda preferida. E é nesse episódio de um passado remoto que você pensa antes de partir a cabeça dele com um machado. É no ingresso, no sacrifício, no favor que você pensa sempre que vai empurrá-lo de uma sacada alta ou mandá-lo calar a boca. É aquele favor que ninguém mais no mundo quis fazer por você que lhe mantém irremediavelmente ligado ao chato e que o faz ter certeza de que ele vai lhe acompanhar até o ocaso da vida. É difícil admitir, mas essa é a verdade. Por mais chato que isso seja pra você.

Diakova

terça-feira, 17 de maio de 2016

O Discípulo da Madrugada - Pe. Fábio de Melo.


É um livro tocante em que o padre Fábio de Melo consegue com uma linguagem simples e encantadora fazer com que a gente lembre de passagens da Bíblia, e isso faz com que o leitor seja um personagem também, pois cabe-lhe sua interpretação.

Em alguns momentos até descreve o leitor como se o conhecesse, mesmo no papel de um pecador, mas nos lembra também que Deus não gosta do pecado, mas ama incondicionalmente o pecador e clama por sua redenção.

O texto nos propõe fazer uma análise de nossas convicções religiosas, e até mesmo humanas, colocando na mesa nossa consciência.

É uma visão evangélica surpreendente e muito inteligente, que nos faz refletir sobre nosso relacionamento com Deus, como pai amoroso, nossa fé e de que papel fazemos como cristãos.



"O dolorido da vida está grávido de beleza. O processo criativo não se alimenta do que temos." p.11


"A Lei nos ensina, mas Cristo nos liberta"p. 28


SEGUE SINOPSE..


A vida espiritual é uma travessia que nunca termina.

Em O Discípulo da Madrugada, Padre Fábio de Melo nos apresenta um personagem religioso e bem-intencionado que tem sua vida modificada ao se tornar amigo de Jesus, antes de presenciar sua crucificação.

Ao ouvir a pregação de Jesus, esse homem sente ruir a estrutura que até então dava sentido à sua vida. Desalojado em si mesmo, ele inicia uma aventura encantadora pelos caminhos da liberdade interior. Um personagem que tem um pouco de todos nós. Ou muito. É preciso observá-lo de perto, pois pode ser que o conheçamos bem. Pode ser até que a identificação seja tão profunda que, sem receios, possamos dizer: este sou eu.


"Mas não foi assim que me ensinaram. Passei boa parte de minha vida firmado no legalismo da regra. Nunca interpretei a obediência como um direito. Apenas como um dever. Fui privado de compreender que estar sob autoridade divina era o mesmo que ser amado." p.91

"Tenho compreendido que muitos  se escondem porque desejam ardentemente ser encontrados". p 167

Diakova

Os doces ontens não podem consumir nossos tão sonhados amanhãs

Incrível como o passado, às vezes, manda em nossas vidas sem que percebamos.
Ele se materializa de várias maneiras, vai e vem como se nossa vontade nem existisse.

É impossível que ele se afaste da gente, sem ele nos esqueceríamos de tudo que já vivemos, dos momentos bons, de glória e dos ensinamentos que adquirimos com sua passagem.
Acredito que seja necessário reviver o passado de vez em quando para que não vivamos condenados a repetir os erros cometidos, ou a manter as expectativas, muitas vezes frustradas.

Mas como eu seria feliz ao apagar ou esquecer fatos do meu passado? Se eu vivi plenamente não devo pensar assim, se vivi uma vida de arrependimentos, sim. Meu passado me pertence e me moldou e me ajudou a ser quem sou hoje.
Gosto de meu passado, ele é o que restou na minha memória de tudo que já vivi até hoje, ele é de fato minha história.


O passado me obrigou a passar por situações que eu não queria, a conhecer pessoas indesejadas, a trabalhar em lugares que não gostava e a fazer várias outras coisas que eu odiava, mas ele fez isso para que eu pudesse v-i-v-e-r, isso mesmo, vivemos de fato, apenas o passado.
O presente é cheio de futuros, cheio de momentos incertos, o passado não, temos a plena certeza que o vivenciamos, e ele está nas gavetas de nossas lembranças para abrirmos quando quisermos.


O passado não vai determinar exatamente quem você é, mas ele está lá, aconteceu, você participou de cada momento dele, você o fez ser vergonhoso ou não. Porém, ele não nos levará longe, se ficarmos voltando sempre aos nossos passados, não avançaremos e nos tornaremos ignorantes acerca do presente, ficaremos consumidos por ideias de “como poderia ter sido”, ou “como era pra ter sido”, e aí sim ele nos fará mal e não seremos dignos de avançar efetivamente.

Apesar de inevitável e necessário, não podemos deixar que os doces ontens consumam nossos tão sonhados amanhãs. Se pararmos pra pensar nisso, talvez percamos a razão, ou passaremos a dar razão a nada.

O que devemos fazer é construir um passado tão bom que ele seja uma ótima companhia na velhice, que ele conduza nossos últimos dias com belíssimas histórias, sem arrependimentos e sem tristezas, que ele seja nosso parceiro, amigo e conselheiro, não um quarto escuro cheio de armadinhas prestes a disparar.

Diakova

terça-feira, 3 de maio de 2016

Eu que não tinha aflição

As vezes as pessoas são só o que são. Sem nada de maior ou incrível. As pessoas são só elas mesmas, sem nada de extraordinário.

São pessoas, falhas, humanas. Se gostamos, gostamos, se não ? Nos afastamos e seguimos buscando. Como uma missão de vida só queremos pessoas agradáveis e diferentes ao nosso lado. Porque somos aflitos e ansiosos por dias maravilhosos que não chegam nunca, ou não os enxergamos nunca??

Algumas pessoas não suportam ser quem são ou querer o que querem, se fantasiam e se misturam tentando uma série de compensações de suas próprias frustrações enquanto pessoas. Aceitar suas aflições é a única saída.
Diakova

segunda-feira, 2 de maio de 2016

Lembro que eu estava inteira

Procura vai, eu sei que ficou um pedaço do meu coração aí, e sei que os momentos lindos ficaram naquela caixa de lembranças. 
Suas promessas não adianta procurar, tenho certeza que essas se perderam, eu avisei pra ter cuidado. 
O que lembro é que antes da ilusão eu estava inteira, viva, colorida. Hoje estou em pedaços, inerte e cinza.
Diakova

Você sempre é responsável por você

O passado existe e é mais real do que imaginamos, ele está lá, sim é verdade, mas ele não pode nos dizer o que deve ser feito daqui pra frente, não podemos viver em função dele, ele nos molda e diz muito sobre a gente, mas não nos domina. 

Se hoje a pessoa não é mais como você sonhou, aceite, siga em frente. Pessoas mudam, não fique com ela porque ela um dia foi assim, ou porque viveram grandes momentos. Você viveu com aquela pessoa antes dela mudar, as coisas passaram e hoje você quer mais. Mas aquela pessoa não existe mais pra te dar o que você precisa hoje. 

E o passado não vai te fazer feliz! Se você não der uma chance a si mesmo com o que você tem e é hoje, nada vai mudar e as tristezas e incertezas irão continuar.
Diakova